quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

AMOR NOS TEMPOS DE CRISE Por: Alex Ribeiro (11.12.2008)


"Hay personas que transforman el sol en una simple mancha amarilla, pero hay tambien quienes hacen de una simple mancha amarilla el proprio sol".

"Existem pessoas que tranformam o sol numa simples mancha amarela, porém existem aqueles que fazem de uma simples mancha amarela o próprio sol."

"There are some people who looks the sun and see a simple yellow brush. But there are others who look at the simple yellow brush and see the big sun. "

Vivemos um momento de esquizofrenia. O mundo e nossos valores padecem numa bipolaridade muito particular onde perdemos de vista (e acho que definitivamente) a noção do que de fato é possível ser feito daqui pra diante...

Um dia o dólar sobe a bolsa cai. Na manhã seguinte as bolsas da Ásia fecham com altas, dólar em baixa, fuga de capitais. E no fim do dia o espírito da manada (agora globalizada) segue a tendência que se inverte na manhã seguinte. Tempos turbulentos que acordam sonhos e desejos adormecidos. Revoluções impossíveis e um caminho que parecia sem volta.

A mão invisível do mercado ficou tão invisível que se perdeu em si mesma, e se materializa numa postura de um pedido desesperado de ajuda a aquele que subordinou a condição de MÍNIMO e de INEFICIENTE. Tão ineficiente que deveria deixar o mundo seguir por caminhos próprios, sem sua interferência e ineficiência...

Mas agora este mínimo vira O MÁXIMO e o único capaz de ajudar ao desesperado, falido e ineficiente mercado a se salvar de si mesmo. Como um pai austero de origem humilde, que com seu próprio suor construiu um império, e que o filho agora adulto, depois de assumir o controle, pôs tudo a perder numa jogatina desmedida, seja nas noitadas (nos eventos de marketing), seja em investimentos sem lastro (derivativos) ou mesmo nas apostas de corrida de cavalos e cassinos (bolsa de valores). Agora este filho volta ao pai desesperado pedindo socorro, mas não o participou nos tempos de bonança. Gastou o que podia nas luzes da ribalta e agora quer dividir os tempos obscuros e de sacrifícios com o pai, com a família e todos os empregados da mansão. Pede o sacrifício de todos, corta salários e cabeças. Corta nas instalações dos empregados mas continua a dormir em lençóis de cetim e a tomar Chateau Petruse e Romanee Conti, comendo Caviar.... Realmente este filho parece estar disposto a sacrifícios...

Como os tempos idos do século XIV, onde o mundo era arrasado pela peste negra, também esta, responsabilidade única dos senhores feudais que condenavam seus servos a viverem em cidades imundas, em condições mais que precárias de higiene, criando o ecossistema ideal aos ratos que espalharam a peste dizimando milhões de pessoas em todo o mundo. Como naqueles tempos, hoje somos chamados a dividir a responsabilidade de uma crise causada por poucos. Como naqueles tempos, hoje somos chamados a assistir os legislativos adaptarem as leis vigentes e se preciso, criar novas leis para conseguir proporcionar a ajuda necessária aos senhores feudais desesperados pela perda de seu lugar de conforto. Os pobres do mundo mais uma vez pagarão as contas de uma crise causada por poucos... Mais uma vez sucumbirão a uma peste negra.

Mais uma vez o clero, os nobres, e os reis serão suportados por mãos e braços de trabalhadores de todo mundo que não ouvindo ao conselho de Marx, não se uniram em prol de si mesmos, acreditando num futuro virtual, seja no reino dos céus ou mesmo na ilusão de acender a classe média. Exatamente como naqueles tempos idos do século XIV, onde só restava aos servos, aos pobres, acender ao clero, ou tentar se sobressair nas guerras e quem sabe ser reconhecido pelo seu rei com algum título de nobreza. E aos trabalhadores só restava aceitar seu destino e seguir vivendo uma vida de servidão. Exatamente como nos tempos atuais, onde, em tempos de crise, seu salário é reduzido, os impostos aumentam e seu emprego ameaçado, sua qualidade de vida prejudicada, para manter vivo o poder do capital. Exatamente como ha 700 anos atrás.

E ainda há quem tenha a coragem de dizer que o SOCIALISMO morreu. O Socialismo é inviável.

Como dizia um velho hino do PCdoB, "O Socialismo renasce todo dia, o socialismo é a mosca na sopa da burguesia".

E é mesmo. E através das orientações do Socialismo mesmo morto, deturpado, desacredito, que nasce uma luz no fim do túnel para os senhores do capital e do neoliberalismo. É através do ESTADO que por força de interesses (infelizmente não tão nobres) não se fez mínimo e hoje consegue se mobilizar para resgatar a turva de afogados deste naufrágio do sistema. É no ESTADO que o grupo que estava e está levando o mundo a bancarrota, busca desesperado ajuda para minimizar o estrago que fizeram até aqui. É socializando os prejuízos com milhões de trabalhadores que não foram convidados pro BANQUETE que acontecia na CASA GRANDE nos tempos de bonança e eram obrigados a se amontoar em volta de uma fogueira feita de gravetos na escura e sombria SENZALA.

Enquanto os banqueiros se banqueteavam na Zona Sul, os trabalhadores se amontoavam na periferia e nos subúrbios depois de horas de trabalho duro e mais algumas apertados no caminho de casa em metrôs e ônibus coletivos.

Os tempos são de esquizofrenia. Matamos um sistema sob a acusação de opressão, de corrupção, de iniqüidades e inviabilidades humanas. Derrubamos os muros da vergonha, privatizamos as empresas, os interesses, os lucros e a vida de pessoas. Abandonamos a luta de classes, perdemos os rumos da revolução. E o único objetivo de um cidadão era acender na escalera social e ganhar seu primeiro milhão. Consumir, TER, TER, TER...

Agora, não sabemos mais o que fazer com o monstro criado. A opressão do homem pelo homem foi substituída pela opressão do homem pelo capital. Este ficou maior que os ESTADOS, e se sobrepôs a qualquer conceito de cidadania. Vieram os extraterritoriais e as transnacionais. Tudo cresceu estratosfericamente, menos os salários... Menos os direitos...Estes só encolheram, e alguns simplesmente deixaram de existir. Os muros ideológicos foram substituídos por muros sociais e em algumas fronteiras muros ainda mais vergonhosos foram levantados. E hoje pra surpresa até do mais visionário pensador, reestatizamos empresas e bancos quebrados, ajudando novamente os senhores feudais a arcar com os prejuízos e com sua incompetência em administrar seu próprio patrimônio. A mão invisível do mercado faz sinais obscenos para o mundo e para a classe trabalhadora, e se pôe em posição de oração diante do ESTADO, outrora ineficiente e que deveria se tornar mínimo. Leis são criadas para favorecer aos senhores feudais na forma da letra da lei, sem que ocorram em nenhum ilícito...

E o mundo liberal clama pela intervenção do Estado. Aquele mesmo estado que deveria se tornar mínimo. E que hoje infla suas dívidas comprando e socializando as dívidas que eram privadas, sem redistribuir os lucros que os senhores feudais tem em seus CPFs particulares, liberando os mesmos de arcar com a responsabilidade solidária nos rombos que ajudaram a criar.

Eu cresci num mundo que oscilava entre esquerda e direita, entre socialismo e capitalismo. Entre União Soviética e Estados Unidos da América. Me tornei adulto num mundo hegemônico, com a URSS destroçada, suas repúblicas desmanteladas e entregues a gangues e máfias que se chafurdaram no comércio ilegal de armas, drogas e prostituição. O legal era ser americano, e conquistar seu primeiro milhão antes dos 40. Aplicar na bolsa, ter reservas em moeda estrangeira, dinheiro em paraíso fiscal.

Hoje o Gigante tombou fazendo tremer a terra abaixo de seus pés. Vidas, muitas vidas estão sendo tragicamente destruídas por conta de uma crise insana, uma crise de valores. Valores Absolutos e valores relativos.

Gente perdendo casas, patrimônio, emprego e dignidade. E os senhores feudais sendo socorridos pelos cofres públicos para não terem de arcar com sua cota pessoal de sacrifício. Com seu patrimônio pessoal.

Quantos executivos e empresários estão perdendo suas casas ? Quantos estão entregando seus carros para as financeiras ? Quantos estão tirando os filhos da faculdade por que não podem pagar? Quantos estão deixando de viajar por que não tem dinheiro ? Quantos estão reduzindo a carne, o leite, as frutas no dia a dia? Quantos estão perdendo seus empregos e poupudos bônus? Quantos vâo arcar na pessoa física com a cagada e lambança feitas na pessoa jurídica ?

Quantos ?

Diante da triste cena mundial em que vivemos, muita coisa fica sem sentido. A esquizofrenia do mercado mundial se transporta para nossas vidas pessoais, impactando nossa forma de nos relacionarmos conosco mesmos. Impactando nossa forma de ver o mundo, nossa forma de viver neste mundo...

Não temos mais o consolo do templo como no século XIV, em que o PAPA dizia que os pobres herdarão o reino dos céus, enquanto os ricos controlavam o Reino da terra.. Isto inclui o Papa.

Não temos mais o ideal revolucionário nem o sonho de um mundo equânime. Estamos acostumados a desigualdade e até nos orgulhamos dela. Orgulhamos-nos de ter acendido na escalera social em detrimento de milhões que morrem de fome mundo afora. Orgulhamos-nos de nossas posses, mas quantos de nós podemos olhar com sinceridade no espelho e se orgulhar de nossas atitudes. Do caminho que fez para chegar lá ?

Quantos podem se orgulhar de não explorar de forma perversa aqueles que não tiveram a mesma sorte de nascer pelo menos num berço de classe média ?

Quantos podem se orgulhar e sinceramente bater no peito dizendo que está absolutamente fora do círculo vicioso de corrupção que nos envolve ?

Quantos de nos empresta aos bancos, e estes por sua vez empresta a quem mais necessita com juros absurdos? Por acaso sou inocente do pecado da usura só por não ser o agiota da base da pirâmide mas que patrocina o esquema de forma indireta?

Quantos de nos pode dizer que tem sido movido pela máxima de um mestre que teve suas palavras manipuladas, deturpadas e adaptadas de forma genial a atender os anseios e necessidades dos senhores feudais que hoje carregam no nome o poder de uma marca forte ?

Quantos de nós pode dizer que "Ama a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo?"

Uma crise nestas proporções supera toda nossa capacidade de articulação material e tem raízes muito mais profundas do que simplesmente a quebra do sub prime americano. A crise de proporções dantescas esta incrustada em nosso desejo perverso de nos sobressairmos, de sermos melhor que nosso irmão, que nosso amigo. A crise esta incrustada no nosso desejo de possuir coisas e pessoas. De usar coisas e pessoas. De ignorar a divindade em cada ser humano que caminha e enxergá-lo apenas como "Mercado de Consumo" e reduzir cada espírito a estatísticas e estratégias de marketing.

A crise tem proporções dantescas por que além de toda a carestia e desigualdades sempre existentes no mundo, ela acelerou um câncer que vinha se desenvolvendo ha séculos. O câncer do DESAMOR.

Abandonamos a simplicidade em prol da complexidade de um mundo de obsolescência planejada e esquecemos que só temos um planeta. Uma terra. Destruímos o meio ambiente, matamos animais, escravizamos pessoas em um regime neoliberal perverso que mutila a capacidade de resistência da maior parcela da humanidade. Criamos exércitos de servos, de operários bem alimentados (e alguns nem tanto) de forma a servir de engrenagem pra um sistema que supúnhamos invencível. Infalível.

Faltou amor. Faltou amor próprio quando nos entregamos ao stress de ganhar dinheiro, levando o corpo ao seu limite físico e o espírito além dos limites morais e emocionais. Faltou amor quando decidimos por em risco uma relação amorosa em favor de uma carreira, status, dinheiro e poder. Faltou amor quando solapamos de nossas crianças e adolescentes sua alegria e tempo, forçando a acelerar o passo, aprender idiomas, fazer intercâmbios, MBAs.

Faltou amor quando perdemos a noção do tamanho que temos. Do desejo que temos.

Faltou amor quando perdemos a capacidade de ser feliz simplesmente. De ser feliz sem TER tanto. Faltou amor quando perdemos a capacidade de "olhar os lírios do campo".

Faltou amor quando nos apertamos e nos oprimimos todo um dia sem ver a luz do sol encaixotado em caixas de vidro ineficientes respirando ar condicionado.

Faltou amor quando perdemos a capacidade de ver em cada mancha amarela um sol, e passamos a ver o sol como uma simples mancha amarela...

Faltou amor e vai faltar muito mais à medida que a crise se agrava e que procuramos tapar seus buracos com pacotes econômicos de estímulo ao consumo. A mais consumo...

E vai continuar faltando amor enquanto estivermos presos no círculo vicioso de trabalhar a morrer para pagar o custo fixo, o cartão de crédito, o carro da moda, a roupa da moda, o estilo da moda, quando nos esquecemos que o essencial é realmente invisível aos olhos.

AMOR SEMPRE FALTA EM TEMPOS DE CRISE, porque TERRA QUE FALTA PÂO TODO MUNDO GRITA E NINGUÉM TEM RAZÂO.

Embora vivamos um triste cenário, com perspectivas terríveis. Comoditizamos tudo, inclusive nossos sentimentos. Influência e conhecimento viraram mais uma das muitas moedas e como nos idos tempos passados, o Sexo nunca foi algo tão estratégico nas relações, sejam elas comerciais ou pessoais.

Mas faltou amor.. e continua faltando...

Espero que o mundo encontre seu equilíbrio. Que se cure desta esquizofrenia e que consiga encontrar um caminho do meio entre as mazelas e virtudes dos regimes socialistas e neoliberais. E que nossa capacidade de superação e aprendizado nos ajude a perceber definitivamente que apenas uma lei deveria constar de nossas constituições:

"Ama teu próximo como a ti mesmo"

Todo resto é vaidade..Vaidade das vaidades. É correr atrás do vento.